Viver o luto


   
          Estou num momento muito complicado dos dois lados da minha família pois minhas duas avós estão muito doentes,  já muito idosas e já estão mostrando muitos sinais de que vão desenlaçar da carne em breve. Hoje, fui visitar minha avó materna depois dela ter saído da UTI e fiquei por horas conversando, massageando seus pés e olhando nos seus olhos, ouvindo suas palavras querendo guardar todos aqueles segundos eternamente dentro de mim, mas teve momentos em que eu me desconcentrei do que ela estava falando e me perdi no seu olhar.

              Depois, como minha avó paterna que mora quase na mesma rua, fui visita-la também e fiquei muito angustiada porque hoje, depois de um ano de após um AVC, ela tem muitas sequelas para falar, não anda, não lembra de mim e ficou com demência. Mas o que mais me abateu foi que diferente dos outros dias em que a visitei, não percebi melhora no seu quadro, pelo contrário, a achei pior, muito mais apática e minha tia relatou que ela tinha passado mal durante a semana e isso pode indicar que ela teve outro AVC, o que é muito grave.

              O que se pode perceber nesses momentos é como cada um de nós encara o luto, a perda de alguém da maneira como pode e não de uma maneira padronizada. Uns se revoltam e não aceitam que o ente querido está indo. Outros simplesmente mantém uma fé inabalável de que a pessoa não vai falecer nem tão cedo, apesar de todo o quadro clínico indicar outro caminho. Tem também pessoas que se afastam, se negam a acompanhar o processo de se despedir da carne do ente querido, mas temos que entender que cada pessoa passa por seus processos internos e ter nosso preconceito, nossa crítica em cima delas não vai mudar nada, pois cada um de nós tem um limite emocional ao qual pode chegar sem se perder nas situações do dia a dia. Já pensou nisso?

              No meu último encontro com minha velhinha de 95 anos, pensei em quanto ela estava sofrendo muito e o quanto não era justo uma pessoa que criou mais de 10 pessoas, incluindo sobrinhos e netos muito bem criados ficar ali, sendo alvo de medicações que estendem o sofrimento físico e que não regeneram o corpo. Não resisti ao vê-la totalmente sem reação, sem querer interagir como nas outras vezes em que fui visita-la.

              Um ponto que precisamos trabalhar em nós é essa relação entre nosso egoísmo e a indústria farmacêutica que prolonga a vida por um lado e retira a dor, mas que não conseguiu ainda fazer com que nós com algumas doenças tenhamos nossa saúde reestabelecida. O egoísmo está no momento em que nós não aceitamos perder quem amamos para uma doença e isso não depende de nós, nem nunca dependerá. Mas fazemos de tudo para ficar do lado da pessoa que amamos, mesmo ela cheia de tubos e toda picada. Não seria melhor aceitar com naturalidade que a morte faz parte da vida?

Quando eu era pequena meu pai diminuía a força do verbo morrer com o verbo: ele descansou e eu acho que é por aí sim, precisamos entender isso. Que aquela carne já teve seu tempo para ser usada pelo ser que habitou nela, que já não tem mais serventia e que a pessoa em si, ela vai continuar a habitar dentro de nós de alguma maneira, seja no nosso jeito de ser, nas nossas lembranças e precisamos entender que sempre aprendemos algo bom com alguém, isso é certo – sobre ser como eles ou não ser como eles.

O que pode nos confortar mais? Nada se esta frase resume tudo “O mais certo da vida é a morte” e não é uma verdade, apesar de ser dura? Até a ciência descobrir caminhos para a imortalidade, ela vai chegar para todos porque é o verdadeiro ponto final de cada vida. Por isso, precisamos aproveitar mais cada pessoa que amamos, cada um mesmo, principalmente os mais velhinhos e aprender nossas histórias de família para poder transmiti-las para as gerações futuras para que elas aprendam com os erros dos antepassados, não precisem cometê-los novamente e também se divirtam com as partes engraçadas da nossa árvore genealógica.

Falando sobre o processo psicanalítico, você sabia que cada um de nós guarda uma história única de vida que se abre como um livro cheio de capítulos em análise e é muito importante trazer para terapia as nossas raízes, os desejos dos nossos parentes, o que nos constituiu como sujeito e resgatar as memórias infantis? Sim! Isso é extremamente importante e vale muito a pena buscar essas informações sobre a sua família e você mesmo.





O que mais me toca sobre essas duas matriarcas?

Elas são pessoas muito distintas, uma se dedicou a ser mãe de 3 mulheres, enquanto a outra quis ter 6 filhos e também ser uma profissional dedicada. Cada uma tem uma história de vida muito bonita e as respeito muito, mas o que fica delas? O que as gerações que vieram delas se tornaram?

Ambas têm como característica comum mimar demais seus filhos, netos e bisnetos preferidos e é perceptível que os filhos e netos mimados por seus avós têm muita dificuldade para ir para a vida, sair mesmo do casulo e seguir adiante com seus planos e é nítido isso em qualquer família.

Os que foram mais acoplados a essas matriarcas que mimam, que os protegem do mundo externo de uma maneira exagerada seguem uma vida com muita insegurança sobre si mesmo, sobre como aprender e sobre seus conhecimentos e isso gera problemas na área pessoal e profissional. Sem falar que em alguns casos, essas mulheres que mimam muito, manipulam muito a maneira como o outro pode viver, mas se entendemos o jogo que se faz, ele é bilateral, ou seja, as duas pessoas envolvidas têm ganhos e perdas com isso.

O ponto crítico no trabalho durante o processo psicanalítico sobre o sistema de mimo é fazer com que a pessoa mimada tente mudar seu padrão de comportamento sobre si mesmo e todos ao redor e reintegre consigo mesmo um caminho para descobrir quais são as suas verdadeiras aptidões, o que realmente gosta de fazer e o que quer fazer de sua vida. São perguntas bem profundas, mas que geram grandes desdobramentos sobre si mesmo.

Você está perdendo alguém que te mimou muito durante a sua vida ou já está passando pelo processo de luto por essa pessoa? Fique atento porque se desfazer desse lugar de mimado é muito complexo e talvez você não vai conseguir sair sozinho desse mal-estar, desse local que você ficou por muito tempo, mas que não te pertence porque você pode ser alguém além disso, uma pessoa mais íntegra, cheia de sonhos próprios e ser mais independente. Já pensou nisso, no quanto você pode conquistar na sua vida com os seus próprios pés e se sentir realizado com isso?  

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P.S.: Publiquei este artigo após o falecimento da minha avó paterna, que foi ontem, dia 26/7/2017.

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